domingo, 28 de setembro de 2008

Turbilhão de sentidos


Dias-turbilhão. De caras, corpos, vozes, cânticos, risos, sorrisos, gritos, aplausos, gargalhadas, cheiros, discursos, avisos, lugares, salas, chãos, tectos, cadeiras, luzes, cores envoltos numa gigantesca nuvem de novidade que vai girando e rodopiando sobre si mesma, levantando a poeira do chão, a poeira daquilo que julgava certo e agora já não faz sentido nenhum.
Sentido. É aquilo que eu agora não consigo atribuir a nada do que me rodeia. Estou sentada numa sala enorme de cadeiras fofas que cheira a cera com cerca de noventa pessoas. Dessas noventa sei o nome de cinco. Sei que há algures alguém que veio do Porto e que ainda não tem onde ficar, alguém queria entrar em Medicina mas não conseguiu, alguém que acho que já vi na natação mas não tenho a certeza, alguém que me lembra o Foreman do House, alguém com pronúncia da Madeira, alguém que não consegue parar de fazer perguntas e alguém que como muitos alguéns naquela sala não me lembra absolutamente nada.
Vou apanhando, assim, no ar que cheira a cera uns pedacinhos da história de alguns que, muitas vezes, nem sei associar a quem pertencem. Limito a ficar ali com os meus pensamentos e as minhas observações embalada pela voz do professor que vai repetindo, irritado, as mesmas coisas cada vez que alguém chega atrasado e ofegante. E penso que toda aquela gente estranha sentada naquela sala de cadeiras fofas vai passar a fazer parte da minha vida. Agora todos eles me parecem exactamente iguais. Eu serei certamente mais uma para todos eles também. Mas talvez daqui a uns tempos possa diferenciá-los apenas pela maneira de andar, conhecer os seus sorrisos, as suas piadas, a sua maneira de estar e, com alguma sorte, a sua maneira de ser. Eles farão o mesmo comigo embora nem saiba o que quero ser para eles. (Quero ser eu própria. E o que é que isso é?)

Enfim, vou atribuir sentidos. Vou pintar todas aquelas pessoas com o feixe de cores da imagem! Vou organizar as cores desse feixe e pintá-las com o sentido que lhes vou aprender a dar com o tempo. Elas farão o mesmo comigo (que cores escolherão?). E, assim, daremos sentido e passaremos a fazer parte da vida uns dos outros. Passaremos a viver-nos porque para viver é preciso, então, pintar coisas e, principalmente, pessoas…


P.S.: Encontrei a imagem acima um pouco por acaso. Tentei saber quem era o seu autor mas não consegui pelo que peço desculpa.


sexta-feira, 19 de setembro de 2008

Os outros Heróis



Another hero, another mindless crime

Podemos considerar os atletas paraolímpicos como sendo uma destas duas hipóteses. Para mim, eles são heróis e penso que o provaram a todo o mundo com mais uma edição dos Jogos Paraolímpicos. Só que tal como todos os paraolímpicos, os paraolímpicos portugueses não fizeram ninguém aguentar o sono a espera dos resultados das provas, nem ocuparam páginas inteiras de jornais, nem abriram telejornais, nem foram tema de conversa de café ou de escola, nem tão pouco fizeram alguem voltar a pôr a bandeira na janela e muito menos ir esperá-los ao aeroporto (tirando família e amigos).

Hold the line, does anybody want to take it anymore

Mas apesar de tudo isso 12 dos 23 atletas portugueses voltaram com uma medalha ao pescoço e com um sorriso no rosto. Sim, eles são deficientes mas não pude deixar de pensar que há muito tempo que não via alguém sorrir assim, de forma tão plena. Eles são deficientes mas foram muito além do linha do possível apenas com a força da sua vontade. A mesma vontade que nós, os ditos "normais", não temos a maior parte das vezes. A vontade de acreditatr que "the show must go on",queiramos ou não. A vontade de nos ultrapassarmos a nós mesmos independentemente das circunstâncias porque ao contrário deles...

does anybody know what we are living for ?

Eles encontraram um sentido para a sua vida, vida essa que à partida todos consideram insuportável, mas que eles, á sua maneira, conseguiram tornar maravilhosa. É para eles ,então ,que dedico este filme que fiz (embora não esteja nada de especial e incompleto , faltando algumas fotografias de atletas que infelizmente não consegui encontrar) e uma das maiores músicas de sempre. Aos Heróis Portugueses!

domingo, 14 de setembro de 2008

"É a Hora!"

13/09/08

"Mas não esqueças que o teu coração está onde está o teu tesouro. E que o teu tesouro precisa de ser encontrado, para que tudo isso que aprendeste no caminho possa fazer sentido."


in "O Alquimista" de Paulo Coelho

Como dizia Fernado Pessoa "É a Hora!". Pois bem e é, de facto, chegada a hora de saber se o caminho e tudo o que aprendemos com ele faz algum sentido. Talvez seja até mais do que isso. É chegada a hora de saber que sentido dar ao caminho. O tesouro está lá, no cume da montanha, e brilha ao sol, fazendo resplandecer em nós a vontade de alcançá-lo como se uma parte de nós se tratasse. É o nosso tesouro. Mas a montanha é alta, há sempre a dúvida sobre qual pedra apoiar os pés e as mãos. Estamos sujos, doridos e sentimos o coração bater mais rápido quer quando olhamos para o chão lá muito em baixo e vemos tudo o que tivemos de abdicar, quer quando vemos o nosso tesouro a brilhar mais próximo. Estamos finalmente, após tão longo caminho, a um passo de estender a mão e alcançar o nosso tesouro. E é então chegada a hora de saber se somos os caminhantes que, vencendo todos os obstáculos, conseguiram alcançar, por fim ,o seu tesouro e o ergueram bem alto para o céu gritando a todos que o caminho que escolheram valeu a pena, que de repente faz tudo sentido e já não estão nem sujos nem cansados nem magoados! Ou se os caminhantes que, vencendo todos os obstáculos, escolheram mal onde a apoiar a mão pela última vez ou escalaram a montanha pelo lado errado e, agora, caem simplesmente pela montanha a abaixo e indo aterrar lá muito em baixo ainda mais sujos, cansados e magoados e amaldiçoando o caminho que escolheram.

É chegada a hora de saber que tipo de caminhantes somos. Se conseguimos ou não alcançar o nosso tesouro. Mas principalmente se é uma simples pedra que vai pôr em casa tudo o que somos e os obstáculos que tivemos que ultrapassar. E se o nosso próprio caminho e os seus obstáculos não serão, afinal, o nosso maior tesouro. Porque como dizia Henry Ford "O verdadeiro êxito é alcançado por aqueles que ultrapassam todos os fracassos sem nunca perder o entusiasmo".

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

Mãos



Sou tudo o que não sou:
Os livros que não leio.
Os amigos que não tenho.
Os instrumentos que não toco.
Os filmes que não vejo.
As fotografias em que não entro.
As bandas que não conheço.
Os jogos que não jogo.
Os sítios a que não vou.
O nada que é tudo.
Sou eu.
Uma mão vazia.

Quero ser vento!
E folhear com uma brisa
Todos os livros do mundo!
E tocar todas as vidas como se fossem minhas
Só porque não o são!
E levar comigo toda a música
De todos os instrumentos, de todos os tempos, de todos os lugares!
E percorrer todas as ruelas, ruas, estradas, avenidas, passeios!
E entrar pela frincha da porta
De todas as lojas, casas, museus, monumentos!
E abanar todas as árvores, arbustos, relva, flores
De todas as aldeias, vilas, cidades, regiões, países, continentes!
E sentir todos os sítios do mundo!
E, por fim,
Levantar do chão todas as folhas caídas
Os meus sonhos!
E faze-los voar com o vento de sede de Mundo!
O Mundo!
O tudo que é nada.
O nada que quero ser.
Uma mão cheia de nada.

Mas o nada que sou hoje
Não é o nada que quero ser amanhã.
O nada de hoje é o de quem
Fixa o chão
Com medo de olhar as estrelas.

O nada de amanhã é o de quem,
Olhando as estrelas,
Se apercebe como afinal
O Mundo é o nada do Universo.