domingo, 28 de dezembro de 2008

Ano novo, vida nova (?)








Acho piada a esta altura do ano. Ao fim. Que para mim nunca é fim de coisa nenhuma. Mas gosto de ouvir o entusiasmo com que as pessoas dizem “ano novo, vida nova” seja porque vão estrear um novo conjunto de pratos, seja porque a partir de dia 1 vão deixar de fumar. Conheço uma pessoa que até faz listas de coisas que quer mudar em si, no novo ano,l istas de objectivos, listas de desejos. Mas quando lhe pergunto se conseguiu realizar os desejos e os objectivos do ano anterior responde-me que sempre perdeu a lista, ou “assim assim”… De qualquer forma (e não querendo de todo parecer irónica por causa do excerto de B.D. do Grafield acima) invejo sempre o seu entusiasmo com o ano novo...
Mas aquilo que me chama mais a atenção nesta altura do ano nem é bem isso. Oiço toda a gente dizer “Jesus, este ano passou tão rápido!” e “É horrível como o tempo passa tão depressa! Nem sequer damos conta!”. E dou por mim a pensar exactamente o mesmo. Todos os anos. Mas acho estranho reclamar por o tempo passar tão depressa quando, na maior parte das vezes na esmagadora maioria dos dias, é exactamente isso que queremos: que o tempo passe depressa. Passamos as aulas a desejar que chegue a hora de saída. Passamos os dias a desejar que cheguem ao fim para podermos ir descansar. Passamos a semana a desejar que chegue o fim-de-semana. Passamos os meses a desejar que cheguem as férias. Passamos os dias de muito calor a desejar que chegue o frio. Passamos os dias como estes de chuva, frio e nevoeiro a desejar que cheguem os dias de calor. Passam as crianças e os jovens os dias a desejarem serem adultos e independentes. Passam os adultos a desejarem ser crianças e jovens livres de responsabilidades. E, no fundo, passamos a nossa vida toda a desejar que cheguem aqueles momentos que podiam durar para sempre, em que o tempo podia simplesmente parar…
E, assim, escorre o tempo por entre as nossas mãos como a areia da praia, deixando-as cheias de grãos de nostalgia e um cheiro no ar a saudade daquilo que nunca chegamos a conseguir apreciar...

terça-feira, 23 de dezembro de 2008

Carta ao Pai Natal



Querido Pai Natal,

O que eu vou querer para este Natal é voltar a acreditar em ti. Voltar a acreditar que algures, numa terra distante, existe uma pequena casinha de madeira com neve no telhado e umas belas rendas á porta, onde vive um senhor muito velhinho e barrigudo com os seus pequenos duendes muito atarefados a embrulhar as últimas prendas. E no meio desse enorme monte de prendas coloridas e dos mais diversos tamanhos estão as minhas (eu que este Natal não cheguei a pedir prenda nenhuma. Já sei que me só me vão dar dinheiro: “Olha não é muito que isto da crise já sabes... mas assim podes comprar aquilo que precisares e prontos”. E prontos problema resolvido.)

Só queria acreditar que talvez agora, Pai Natal, estivesses já a carregar todas essas prendas para o teu trenó onde vais percorrer o mundo e entregá-las aos meninos e meninas de todos os países (odeio a geografia que diz que o mundo não se pode percorrer apenas numa noite, odeio a biologia para a qual as renas não voam e odeio a lógica que me parece gritar as ouvidos que todas as prendas do mundo não podem caber num trenó).
Só queria voltar a riscar os dias no calendário que faltam para o dia 25 (e não desejar que o tempo parasse durante um mês ou dois: talvez assim me conseguisse preparar como deve de ser para os 9 exames que vou ter em Janeiro).
E acordar todos os dias de manhã com músicas de Natal nos ouvidos (agora só me lembro delas nos centros comerciais cheios de gente aos encontrões e comento com alguém que o disco é sempre o mesmo).
E passear de mão dada com a minha mãe pelas ruas de Lisboa aos saltos e com os olhos presos nas mil luzinhas brilhantes que cintilam lá no alto dos postes (sem pensar em aquecimentos globais, má gestão dos dinheiros públicos e nos mendigos sentados por debaixo dos postes com as mão estendidas).
E ficar na noite de Natal tempos infinitos no sofá, enrolada no roupão, a olhar para a árvore à espera de um barulho qualquer vindo da chaminé e um “ho-ho-ho” distante (e não a mandar e a receber sms com medo de me esquecer de alguém) para depois acabar por adormecer.
Só queria voltar a acordar de manhã e ir a correr para a árvore de pijama e descalça desembrulhar os meus presentes e lançar gritinhos de felicidade e suspresa (e não a abrir envelopes, a contar dinheiro e pensar que é melhor guardar a maior parte porque isto agora com a crise...).
E passar o resto do dia a brincar, a rir e a roubar doces e pinhões da mesa (e não a pensar que dali a duas semanas vão estar a fazer o exame teórico-prático de Anatomia I).
Como vês Pai Natal até que não peço muito... No fundo, gostava apenas de desejar Feliz Natal a todos aqueles que me rodeiam. Mas já nem isso gosto de fazer pois já nem sei bem do que estou a falar...

domingo, 14 de dezembro de 2008

Green gloves


Green Gloves - The National

(...)


Take another sip of them,
it floats around and takes me over
like a little drop of ink in a glass of water


(...)

Now I hardly know them
and I'll take my time
I'll carry them over, and I'll make them mine.


Get inside their clothes
with my green gloves
watch their videos, in their chairs.
Get inside their beds
with my green gloves
Get inside their heads, love their loves.


Porque eu hoje só queria ter a vida deles e não a minha, ser eles e não eu. E era tão bom que, tal como, Fernando Pessoa dizia:

"Assim como lavamos o corpo devíamos lavar o destino, mudar de vida como mudamos de roupa."

E eu não quero a roupa que escolheram para mim (mesmo que não tenha sido de propósito)!Nem as cores que com que me pintam( mesmo que não dêem conta)! Só queria poder tirar todas estas roupas de cima do meu corpo e lavar todas essas cores com green gloves de esperança
...

sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

Luzes

Chegou o Natal. Assim o diz a senhora que se senta ao meu lado no autocarro carregada de embrulhos de vários tamanhos e papel de embrulho de muitas cores com pequenas árvores de natal intercaladas entre os grandes símbolos da marca da loja. Arfa com o esforço de tentar meter todos os embrulhos, ora no colo, ora no chão, e começa a barafustar com um rapaz que lhe pisa o saco de um dos embrulhos numa travagem mais violenta. Decido pôr os phones nos ouvidos para não ouvir o resto das resmunguices e reparo que estamos no mesmo sítio há 5 minutos numa fila interminável de chapa metálica, luzes vermelhas e fumo. No passeio várias pessoas acumulam-se para ver o acidente até lançarem tal vez um "oh valha-me Deus um acidente destes e logo na hora de ponta!" para o vizinho do lado que não conhecem de lado nenhum e seguirem o seu caminho apressadas mal reparando nas grandes árvores de luzinhas verdes e sinos amarelos que cintilam por cima delas.
Adoro luzes de Natal mesmo as mais simples como estas que vejo do outro lado da janela. Mas nem isso consigo apreciar agora que tenho tempo para isso...
Mais cinco minutos passaram, ainda vou a metade do caminho, tenho a matéria dos sinalizaçao celular com cAMP, proteína G e canais de sódio de hoje para tentar perceber e o relatório de Biofisica para entregar amanhã.

Alguns condutores das chapas metálicas fumegantes saem para a rua e falam ao telemóvel enquanto gesticulam.

O livro de "Anatomia dos Animais Domésticos" está a tornar as minhas pernas dormentes.

Começa a chover.

Bolas, lembrei-me agora que tenho ainda os exercícos de biofísica para fazer e não percebi uma parte do que era suposto ter percebido.

Os condutores acidentados continuam a discutir com os papéis do seguro na mão.

Só quero sair daqui...

As pessoas barafustam no autocarro contra tudo mas para ninguém, os bebés choram, uma miúda começa a fazer birra que assim perder os morangos.

Por favor, doí-me tanto a cabeça, só quero ir para casa...

Começa a chover cada vez mais, os carros apitam cada vez mais, as pessoas barafustam cada vez mais, os bebés choram cada vez mais, ouve-se a sirene da polícia.

Só quero fugir daqui! Dar um pontapé aos embrulhos da senhora ao lado! Mandar o livro de Anatomia, o caderno de apontamentos e os exercícos de biofisica contra a fila de trânsito! Mandar calar os bebés e a miúda que faz birra! E gritar a todo o mundo que as iluminações de Natal são puro desperdício de dinheiro e energia e o Natal é apenas um hino ao consumismo! E depois teletransporto-me para casa, tranco a porta e deixo-me escorregar lentamente do outro lado para um mundo de silêncio e escuridão.

Silêncio e escuridão quando eu sei que o que eu mais preciso é de luz... De muitas e muitas luzinhas cintilantes e mutantes de cor que me iluminem. Preciso de muitas luzinhas que me façam aguentar estes dias e vê-los apenas como dias menos bons. E muitas cores que pintem os meus dias e acabem com este pano de fundo cinzento que vêm nem sei de onde, não mata mas mói e teima em não passar.
Como a chuva que bate incessantemente do outro lado da janela do autocarro embaciada.
Preciso de luzes. Iluminem(-me)...


Foto retirada do site Olhares.

terça-feira, 25 de novembro de 2008

O efeito borboleta, de John R. Leonetti

(Sei que se algum cinefólio ou critico de cinema ou simplesmente alguém que não gostou deste filme vir nem que seja o titulo deste post vai revirar os olhos, abanar com a cabeça e pensar que sou alguma fã doida do Ashton Kutcher mas paciência… )


Change one thing. Change everything.

Se já fosse muito velhinha, diria que “O efeito borboleta” era um dos filmes da minha vida, não porque seja uma grande produção cinematográfica porque não é, mas sim por aquilo que lhe está inerente. Gosto de filmes… assim. Os filmes que me dizem tanto em todos os sentidos que por mais que escreva, apague, reescreva nunca consigo descrever em palavras quão bom é o filme e acabo a pensar que, de facto, não sou boa com as palavras. Os filmes que têm uma verdadeira mensagem. E, neste caso tem, finalmente, uma teoria que aceito: a teoria do caos. A teoria que tudo explica precisamente por não querer explicar nada em geral, por não querer quantificar nada, por não querer reduzir tudo a verdades definitivas, gerais, absolutas. E mesmo quando esta teoria é aplicada na Física, o máximo que consegue fazer é quantificar a incerteza. Não há verdades feitas, coisas que “são assim e pronto”. Tal como na vida.
A história do filme gira, então, em torno de um rapaz, Evan Treborn (Ashton Kutcher), com a capacidade de alterar o passado e que decide por isso em prática para poder “corrigir” determinados momentos do seu passado, dos seus amigos, da rapariga de quem gosta. Só que descobre que fazendo essas pequenas “correcções” altera drasticamente a sua vida e a de todos o que o rodeiam e nem sempre para “melhor” o que o leva a querer fazer cada vez mais alterações num ciclo sem fim.
A teoria do caos é isso mesmo. O Destino de cada um está traçado de facto. Mas é pelas pequenas escolhas que tomamos todos os dias sem nos apercebermos, sem sequer pensarmos que estamos a construir o rumo da nossa vida e não só, inconscientemente, com todas as pessoas que dela fazem parte, com todos os lugares, com todas sensações que podiam ser estas mas também outras no caos de possibilidades dados pelos nossos sentidos e percepções. ..
E algumas dessas possibilidades estão exploradas neste filme em relação a uma simples situação que é uma brincadeira de miúdos. É um filme que, quanto a mim, conseguiu não deixar escapar os pequenos grandes pormenores, fazer uma grande caracterização das personagens nas diferentes possibilidades de vida e onde tudo, no final, acaba incrivelmente por bater tudo certo. Mas não digo que este filme seja a melhor produção cinematográfica de sempre (para mim esse lugar continua a ser ocupado pelo "The Fountain" de Darren Aronofsky) porque está muito longe disso, principalmente pela forma como foi apresentado ao público (razão pela qual não ponho aqui o trailler que odeio) e pela ideia que deixa transparecer ao primeiro contacto.
Tal como na teoria do caos. Confusa, idiota, inútil pode ser uma teoria que não explicar nada mas também pode ser verdadeira e universal precisamente porque dá conta que nada pode ser completamente explicado, definido, calculado, determinado…

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Tudo (errado)certo


Nunca fui muito de fazer desenhos. Sempre preferi escrever e ver nos desenhos dos outros aquilo que gostava de conseguir expressar se tivesse arte suficiente para isso. Mas também não se pode chamar à figura acima um desenho...
Foi simplesmente algo que me deu uma vontade enorme de fazer num intervalo para a hora de almoço. Num daqueles dias em que disse "bom-dia" tal como todos os outros, sorri tal como todos os outros, contei piadas tal como todos os outros, ouvi piadas tal como todos outros, suspirei pelas quantidades industriais de matéria tal como todos os outros.
Mas num daqueles dias em que está tudo errado. Em que dizemos "bom-dia" por dizer, sorrimos por sorrir, contamos piadas por contar, ouvimos piadas por ouvir, suspiramos por suspirar. Não há é ninguém para ver o que está errado tal como não há ninguém para ver o que está certo. E, assim, acaba tudo em dias de (errado)certo e dúvida...
Este desenho é, então, o ténue reflexo de uma semana em que tal como Álvaro de Campos dizia:

"Sim, está tudo certo.
Está tudo perfeitamente certo.
O pior é que está tudo errado."

(...)

Mas, está claro, está tudo certo...
E, excepto estar errado, é assim mesmo, está certo..."

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Um artigo cómico (ou talvez não)...

“O site scientificmatch.com funciona com base na teoria de que as pessoas se sentem atraídas pelo cheiro de companheiros com um sistema imunológico o mais diferente possível do seu – e que essa informação e determinação pode ser feita através dos genes. Assim, depois de realizada a análise do DNA, os especialistas comparam os seus dados com os de outras pessoas existentes na base de dados para encontrar um sistema imunológico compatível. Ao analisar os sistemas imunológicos dos candidatos, os representantes do site asseguram que conseguem formar casais perfeitos, menos tentados para a possibilidade de traição e capazes de terem filhos mais felizes e saudáveis.”

In revista-qualquer-do-bar-da-faculdade-que-me-dei-ao-trabalho-de-copiar

Sorrisos. Gargalhadas. Piadas. Revirar de olhos. Tudo isto este artigo provocou a apaixonados e não apaixonados de um curso com uma cadeira de Genética onde aprendemos, logo na primeira aula, que chimpanzés e seres humanos partilham 99% do seu património genético.

Mas este artigo não é sobre chimpanzés… E acho que, entre as gargalhadas que enchem a mesa, todos nós nos perguntamos se acreditamos na definição de amor deste artigo ou não. O tal fenómeno mágico (que, afinal, segundo este artigo de mágico tem pouco…) que toda a gente quer viver.

Mas talvez a resposta a pergunta da praxe “Acreditas?” só dependa do grau de romantismo de cada um. Eu não sei. Não quero saber. Tal como os apaixonados que são os que se mais riem com este artigo, a origem do amor não me interessa. O facto de os americanos fazerem negócio com tudo também não. Interessa-me apenas aquilo que não consigo ver ou aperceber-me e que tendo à partida desprezar ou a rir. Como o facto de sermos ainda menos livres na escolha das pessoas de quem gostamos. Treta ou não, não deixo de acreditar, por segundos, quando as gargalhadas cessam por fim, que, tal como F.P. dizia, talvez:

“Isto é quem somos, e é tudo!”

(Ou não… Tu sabes? Eu não…)

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Realidades

Esta imagem podia descrever alguns dos meus dias. Dias como o de hoje. Um remoinho de sentimentos que ainda não sei definir, uma multidão de pessoas que me podem dizer tudo e, por isso, ainda nada me dizem. É um remoinho ainda formado de muitos feixes com muitas cores de diferentes realidades. Mas talvez as cores pudessem ser diferentes. Não o azul, não o violeta, não o cinzento, não o preto. Talvez o cor-de-laranja, o encarnado, o branco. Mas são exactamente estas cores com que hoje eu pintei os outros à minha volta tal como aquele círculo de feixes luminosos. Aquele azul metálico lembra-me o lume frenético das conversas do refeitório. Aquelas conversas que começam não se sabe de onde nem porquê, que podem ser sobre coisas banais como o prato preferido de cada um ou os gostos musicais ou sobre a próxima festa não sei aonde. Conversas em que toda a gente quer falar ao mesmo tempo e se dar a conhecer para depois terminarem num repentino silêncio quando não há absolutamente mais nada a dizer mas muito ainda por conhecer...
Aquele amarelo mais vivo lembra-me a alegria contagiante de alguns. Aqueles que têm sempre algo a dizer e que toda a gente parece conhecer. O amarelo mais pálido a energia com que tento conhecer toda a gente, decorar os nomes, começar conversas com a esperança (o amarelo mistura-se também com o verde na imagem…) de encontrar nem sei bem o quê. Um grupo estável de amigos se é que isso ainda faz sentido aqui. Mas mesmo que fizesse… (não, quando talvez o que eu mais procuro nos outros é encontrar-me a mim própria...)
Daí tanta cor indefinida nesta imagem do meu dia, de mim própria. Existem tantos tons de violeta nesta imagem… Tantas realidades de mim própria. O violeta. Aquela cor que uns dizem que é cor-de-rosa escuro, outros lilás, outros roxo e outros coisa nenhuma. Tal como a opinião inconsciente dos Outros sobre mim própria talvez. E a minha também. Porque entre o amarelo, o verde, o violeta e todas as outras cores por definir na imagem existem também borrões pretos. São os momentos das saudades, os borrões coloridos de um passado recente pintado a cinzento. São os momentos em que me apago. Em que não consigo captar nada do que me rodeia. Em que não sinto os Outros nem lhes vejo as cores com a indefinição das minhas próprias cores. Em que deixo simplesmente de sentir e me perco a mim própria por não saber quem sou: Eu. Eu própria. Sem as cores dos Outros e as cores (ou falta delas) com que pintam… Sem saber qual a minha cor. Sem saber qual é a minha realidade...


E eis que todas as cores se voltam a misturar outra vez para formar outra realidade…Mas, desta vez, organizam-se para formar uma realidade concreta e objectiva e a mesma que o professor de Histologia entoa com uma voz que se vai tornando cada vez mais próxima. Uma realidade em que esta imagem já não é a imagem do meu dia ou de mim própria. Uma realidade em que esta imagem é apenas o que está escrito na legenda abaixo:

“Corte de um sistema de Havers ou ósteon. Notar a alternância de círculos claros e escuros resultantes da alternância na direcção das fibras colagénias. As fibras colagénias aparecem claras quando cortadas longitudalmente e escuras em corte transversal. No centro do ósteon, a violeta, o canal de Havers. Pricosirius. Foto de microscopia de luz polarizada.“

sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Um segredo fechado


Longe daqui,
Tens um segredo guardado,
Para abrir,
Num lugar mais desejado,
Num lugar onde possas saber,
Que por ser segredo não podes dizer...

Serás tu a sombra que olhas no chão,
Serás a promessa que trazes na mão,

(…)

Serás o silêncio ou um sonho desfeito,
Será teu o grito que arrancas do peito,

(…)

Longe daqui,
Tens um desejo fechado,
Para abrir
Num lugar mais arejado,
Num lugar onde possas saber,
O que há já muito tempo ficou por dizer...

(…)

Ficaste longe daqui,
Tu estás longe de ti...

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Blindness



Blindness - o filme pelo qual espero há meses chega a 13 de Novembro a Portugal, finalmente. O filme inspirado numa das maiores obras que li até hoje: "Ensaio sobre a Cegueira" de José Saramago.

Geralmente acho que as adaptações cinematográficas de livros são, grosseiramente falado, como tentar ver toda uma cidade de um rés-de-chão... O livro acaba, assim, invarialvelmente por ser sempre mais rico e, principalmente, mais livre do que o filme inspirado nele... Por isso, e apesar de garantida a participação de grandes actores como Jullianne Moore e Dany Gloover, acho que Fernando Meirelles, o realizador deste filme, tinha uma missão épica. Missão essa que aparentemente conseguiu cumprir apesar de ter suscitado um coro de criticas por parte de várias associações de audiovisuais (que terão lido o livro?) e muitos poucos aplausos. No entanto, Blindness foi considerado um dos melhores filmes de abertura do festival de Cannes pelos criticos só que isso é apenas a sua opinião por mais entendidos que sejam no assunto... Agora, emocionar o próprio José Saramago quando este assistiu ao filme pela primeira vez...

Não duvido que seja um filme "forte", o livro é arrebatador. Mas ao que parece o filme é tão "forte" que, nos Estados Unidos, houve várias pessoas que abondonaram o filme a meio porque simplesmente já não aguentavam ver mais.

Mas, para mim, isso não é de estranhar quando nos é mostrado o lado pior do Homem e de repente nos vemos a nós próprios e aos outros de uma forma que nunca julgámos possível talvez porque nunca nos tenhamos visto realmente. E, de facto, tal como diz o trailler "a única coisa mais assustadora que a cegueira é sermos os únicos a ver"...

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Feira de livros para não preconceituosos


Bem, para quem ainda não sabe está a decorrer até 18 de Outubro na praça da Figueira em Lisboa a VIII Feira do Livro Manuseado. Esta feira está aberta desde as 19h às 20h e, tal como o nome indica, é constituída apenas por restos de stocks, fins de edição, promoções, saldos, livros com deficiente apresentação mas com conteúdo intocável e edições já raras.

É claro que os livros expostos à primeira vista não são muito apelativos. É claro que os livros de autores mais conhecidos e edições mais raras das chamadas grandes obras já desaperaceram simplesmente. É claro que não há sitios onde nos possamos sentar calmamente a folhear um livro nem ar condicionado como na fnac. É claro que saimos de lá com ao pregão do homem das rifas à entrada da tenda nos ouvidos e as mãos ligeiramente castanhas do pó dos livros...


Mas pondo de fora estes preconceitos... Sei que levei três livros, paguei 12 euros (quando geralmente pago, em média, mais de 15 euros por um) e esperam-me longas horas de boa literatura. Além disso, se me aborrecer com algum destes livros sempre me posso entreter a pensar por que sítios terão andado e por que mãos terão sido manuseados até terem vindo parar às minhas...


terça-feira, 7 de outubro de 2008

A outra lenda de Narciso



Já toda a gente ouviu falar da lenda de Narciso nem que seja pelo narcisismo, palavra muito em moda nos dias de hoje ao contrário da filosofia/atitude por este nome caracterizada que nunca passou de moda. Reza, então, a lenda que um belo jovem de nome Narciso estava tão fascinado por si mesmo que, certo dia, caiu dentro do lago, onde ia todos os dias contemplar a sua beleza, e acabou por morrer afogado. No lugar onde caiu nasceu, pois, uma bela flor a que chamaram de narciso.
No entanto, não era assim que o escritor Oscar Wilde acabava esta história. Ele contava que quando Narciso morreu, apareceram as Oréiades (as ninfas do bosque) e viram o lago de água doce transformado num lago de água salgada.
- Por que choras? – perguntaram as Oréiades.
- Choro por Narciso. – respondeu o lago.

-Ah, não nos espanta que chores por Narciso… Afinal, apesar de todas nós sempre termos corrido atrás dele pelo bosque, tu eras o único que tinha a oportunidade de contemplar de perto a sua beleza.
- Mas Narciso era belo? - perguntou o lago intrigado.

- Quem mais do que tu poderia saber isso? Era nas tuas margens que ele se debruçava todos os dias…
O lago ficou, então, uns momentos em silêncio. Por fim, disse:
- Eu choro por Narciso, mas nunca me tinha apercebido que ele era belo. Choro por Narciso, porque todo as vezes que ele se debruçava sobre as minhas margens eu podia ver, no fundo dos seus olhos, a minha própria beleza reflectiva.


Talvez muito haja a dizer sobre esta outra lenda de Narciso. Ou talvez não. Mesmo assim vou arriscar dizer algo embora não por palavras minhas:

“Cada vez irei vendo menos, mesmo que não perca a vista tornar-me-ei mais e mais cega cada dia porque não terei quem me veja.”
in "Ensaio sobre a Cegueira" de José Saramago

Narciso olhava o lago apenas para se ver a si próprio. O lago olhava nos olhos de Narciso apenas para se ver a si próprio. E, no fundo, ninguém via ninguém. Ninguém era visto e ninguém via.(ou vice-versa). É ser-se completamente cego: aos Outros e a nós próprios se é que, no fundo, não é tudo a mesma coisa...

domingo, 28 de setembro de 2008

Turbilhão de sentidos


Dias-turbilhão. De caras, corpos, vozes, cânticos, risos, sorrisos, gritos, aplausos, gargalhadas, cheiros, discursos, avisos, lugares, salas, chãos, tectos, cadeiras, luzes, cores envoltos numa gigantesca nuvem de novidade que vai girando e rodopiando sobre si mesma, levantando a poeira do chão, a poeira daquilo que julgava certo e agora já não faz sentido nenhum.
Sentido. É aquilo que eu agora não consigo atribuir a nada do que me rodeia. Estou sentada numa sala enorme de cadeiras fofas que cheira a cera com cerca de noventa pessoas. Dessas noventa sei o nome de cinco. Sei que há algures alguém que veio do Porto e que ainda não tem onde ficar, alguém queria entrar em Medicina mas não conseguiu, alguém que acho que já vi na natação mas não tenho a certeza, alguém que me lembra o Foreman do House, alguém com pronúncia da Madeira, alguém que não consegue parar de fazer perguntas e alguém que como muitos alguéns naquela sala não me lembra absolutamente nada.
Vou apanhando, assim, no ar que cheira a cera uns pedacinhos da história de alguns que, muitas vezes, nem sei associar a quem pertencem. Limito a ficar ali com os meus pensamentos e as minhas observações embalada pela voz do professor que vai repetindo, irritado, as mesmas coisas cada vez que alguém chega atrasado e ofegante. E penso que toda aquela gente estranha sentada naquela sala de cadeiras fofas vai passar a fazer parte da minha vida. Agora todos eles me parecem exactamente iguais. Eu serei certamente mais uma para todos eles também. Mas talvez daqui a uns tempos possa diferenciá-los apenas pela maneira de andar, conhecer os seus sorrisos, as suas piadas, a sua maneira de estar e, com alguma sorte, a sua maneira de ser. Eles farão o mesmo comigo embora nem saiba o que quero ser para eles. (Quero ser eu própria. E o que é que isso é?)

Enfim, vou atribuir sentidos. Vou pintar todas aquelas pessoas com o feixe de cores da imagem! Vou organizar as cores desse feixe e pintá-las com o sentido que lhes vou aprender a dar com o tempo. Elas farão o mesmo comigo (que cores escolherão?). E, assim, daremos sentido e passaremos a fazer parte da vida uns dos outros. Passaremos a viver-nos porque para viver é preciso, então, pintar coisas e, principalmente, pessoas…


P.S.: Encontrei a imagem acima um pouco por acaso. Tentei saber quem era o seu autor mas não consegui pelo que peço desculpa.


sexta-feira, 19 de setembro de 2008

Os outros Heróis



Another hero, another mindless crime

Podemos considerar os atletas paraolímpicos como sendo uma destas duas hipóteses. Para mim, eles são heróis e penso que o provaram a todo o mundo com mais uma edição dos Jogos Paraolímpicos. Só que tal como todos os paraolímpicos, os paraolímpicos portugueses não fizeram ninguém aguentar o sono a espera dos resultados das provas, nem ocuparam páginas inteiras de jornais, nem abriram telejornais, nem foram tema de conversa de café ou de escola, nem tão pouco fizeram alguem voltar a pôr a bandeira na janela e muito menos ir esperá-los ao aeroporto (tirando família e amigos).

Hold the line, does anybody want to take it anymore

Mas apesar de tudo isso 12 dos 23 atletas portugueses voltaram com uma medalha ao pescoço e com um sorriso no rosto. Sim, eles são deficientes mas não pude deixar de pensar que há muito tempo que não via alguém sorrir assim, de forma tão plena. Eles são deficientes mas foram muito além do linha do possível apenas com a força da sua vontade. A mesma vontade que nós, os ditos "normais", não temos a maior parte das vezes. A vontade de acreditatr que "the show must go on",queiramos ou não. A vontade de nos ultrapassarmos a nós mesmos independentemente das circunstâncias porque ao contrário deles...

does anybody know what we are living for ?

Eles encontraram um sentido para a sua vida, vida essa que à partida todos consideram insuportável, mas que eles, á sua maneira, conseguiram tornar maravilhosa. É para eles ,então ,que dedico este filme que fiz (embora não esteja nada de especial e incompleto , faltando algumas fotografias de atletas que infelizmente não consegui encontrar) e uma das maiores músicas de sempre. Aos Heróis Portugueses!

domingo, 14 de setembro de 2008

"É a Hora!"

13/09/08

"Mas não esqueças que o teu coração está onde está o teu tesouro. E que o teu tesouro precisa de ser encontrado, para que tudo isso que aprendeste no caminho possa fazer sentido."


in "O Alquimista" de Paulo Coelho

Como dizia Fernado Pessoa "É a Hora!". Pois bem e é, de facto, chegada a hora de saber se o caminho e tudo o que aprendemos com ele faz algum sentido. Talvez seja até mais do que isso. É chegada a hora de saber que sentido dar ao caminho. O tesouro está lá, no cume da montanha, e brilha ao sol, fazendo resplandecer em nós a vontade de alcançá-lo como se uma parte de nós se tratasse. É o nosso tesouro. Mas a montanha é alta, há sempre a dúvida sobre qual pedra apoiar os pés e as mãos. Estamos sujos, doridos e sentimos o coração bater mais rápido quer quando olhamos para o chão lá muito em baixo e vemos tudo o que tivemos de abdicar, quer quando vemos o nosso tesouro a brilhar mais próximo. Estamos finalmente, após tão longo caminho, a um passo de estender a mão e alcançar o nosso tesouro. E é então chegada a hora de saber se somos os caminhantes que, vencendo todos os obstáculos, conseguiram alcançar, por fim ,o seu tesouro e o ergueram bem alto para o céu gritando a todos que o caminho que escolheram valeu a pena, que de repente faz tudo sentido e já não estão nem sujos nem cansados nem magoados! Ou se os caminhantes que, vencendo todos os obstáculos, escolheram mal onde a apoiar a mão pela última vez ou escalaram a montanha pelo lado errado e, agora, caem simplesmente pela montanha a abaixo e indo aterrar lá muito em baixo ainda mais sujos, cansados e magoados e amaldiçoando o caminho que escolheram.

É chegada a hora de saber que tipo de caminhantes somos. Se conseguimos ou não alcançar o nosso tesouro. Mas principalmente se é uma simples pedra que vai pôr em casa tudo o que somos e os obstáculos que tivemos que ultrapassar. E se o nosso próprio caminho e os seus obstáculos não serão, afinal, o nosso maior tesouro. Porque como dizia Henry Ford "O verdadeiro êxito é alcançado por aqueles que ultrapassam todos os fracassos sem nunca perder o entusiasmo".

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

Mãos



Sou tudo o que não sou:
Os livros que não leio.
Os amigos que não tenho.
Os instrumentos que não toco.
Os filmes que não vejo.
As fotografias em que não entro.
As bandas que não conheço.
Os jogos que não jogo.
Os sítios a que não vou.
O nada que é tudo.
Sou eu.
Uma mão vazia.

Quero ser vento!
E folhear com uma brisa
Todos os livros do mundo!
E tocar todas as vidas como se fossem minhas
Só porque não o são!
E levar comigo toda a música
De todos os instrumentos, de todos os tempos, de todos os lugares!
E percorrer todas as ruelas, ruas, estradas, avenidas, passeios!
E entrar pela frincha da porta
De todas as lojas, casas, museus, monumentos!
E abanar todas as árvores, arbustos, relva, flores
De todas as aldeias, vilas, cidades, regiões, países, continentes!
E sentir todos os sítios do mundo!
E, por fim,
Levantar do chão todas as folhas caídas
Os meus sonhos!
E faze-los voar com o vento de sede de Mundo!
O Mundo!
O tudo que é nada.
O nada que quero ser.
Uma mão cheia de nada.

Mas o nada que sou hoje
Não é o nada que quero ser amanhã.
O nada de hoje é o de quem
Fixa o chão
Com medo de olhar as estrelas.

O nada de amanhã é o de quem,
Olhando as estrelas,
Se apercebe como afinal
O Mundo é o nada do Universo.

quarta-feira, 27 de agosto de 2008

Homenagem a Carlos Paião

Com um dia de atraso decidi fazer a minha homenagem ao maior artista da música portuguesa (ou seja, português e que canta na sua suposta língua) e um dos melhores compositores dos anos 80 que faleceu no dia 26 de Agosto de 1988 por causa de uma mangueira atravessada no meio da estrada e um camião parado onde não devia. E escolhi esta musica que toda a gente conhece e que é talvez uma das músicas que mais gosto não só dele mas de todas as musicas que já ouvi.

Sim, chamem-me lamechas. Foi exactamente isso que eu chamei a minha mãe quando ontem no carro estava a ouvir dEUS no mp3 e ao dar esta musica na rádio ela ficou com uma lágrima no cantinho no olho… Mas depois já em casa e sozinha no quarto voltei a ouvir esta música e quem ficou com uma lagrimazinha no canto do olho fui eu. Sim, sou lamechas se ser lamechas é recordar o tempo em que fomos crianças. O tempo em que havia cinderelas e príncipes. O tempo em que não havia gajas e gajos, damas e damos e por aí a fora. O tempo em dizer “eu gosto de ti” queria dizer isso mesmo. O tempo em que não era preciso saber as diferenças entre curtir, andar e namorar. O tempo em que as pessoas que gostamos não morrem apenas vão para o céu e lá ficam a cuidar de nós. O tempo em que não sabia o que eram pedófilos nem violadores. O tempo em que um gelado de morango apagava todas as tristezas do mundo.

Esta música faz-me voltar esse tempo. Faz-me não querer saber de mais nada. Não quero saber se é a uma boa ou má musica, quem a compôs, se a letra rima, se o vocalista desafina mais nos graves ou nos agudos, de que género é. Não quero saber nada disso porque isso faria desta música uma música igual a tantas outras: feita para ser apreciada. Pois bem, ao contrário de todos as outras músicas eu não quero apreciar esta música: quero senti-la! Quero voltar ao tempo em que tal como esta musica todos éramos puros, inocentes, genuínos… Ao tempo em que éramos, como diz a música, simplesmente “Crianças a viver esperanças, a saber sorrir”...

sexta-feira, 22 de agosto de 2008

Watchmen: leiam!



Bem, eu talvez, ou melhor de certeza, que eu não sou a melhor pessoa para fazer uma crítica a um comic book, principalmente a crítica a este comic book. Também não é bem isso que tenciono fazer com este post, por isso tenho desculpa :P

Este foi dos primeiros comic books a sério que li (excluindo obviamente Tio Patinhas, Pato Donald e companhia que são de outro “mundo”). E comecei a lê-lo com sérias dúvidas que fosse gostar. Correndo o risco de ser injusta, para mim este género de comic books era sinónimo de esquemas manhosos sempre descobertos de forma brilhante pelos heróis no último instante, heróis esses com pinta de galãs e que acabavam por protagonizar cenas quentes com mulheres de “grandes” atributos físicos e semi-nuas, para não falar das invariáveis cenas de porrada contra os feios vilões pelo meio.

Mas o Watchmen não é nada disso! Apesar de partir de um ponto comum -heróis mascarados com o objectivo de salvar o mundo - transcende tudo aquilo que costuma estar inerente a histórias de heróis mascarados que nada têm de novo. Em Watchmen não creio mesmo que hajam heróis e vilões. Tudo é um pouco deixado à interpretação do leitor. E talvez, por isso, este comic seja tão complexo, além de falar de um pouco de tudo: História, Filosofia, Ciência, Arte, Sociologia, Ética… Nomes que em si pouco dizem mas com este comic adquiriram para mim um novo significado bem mais interessante. Falta-me falar do grafismo mas, como também não sou grande perita no assunto, limito-me a dizer que, na minha opinião, este comic é brilhante a nível dos pormenores, da forma como a cena é apresentada…

É obvio que muito mais havia a dizer sobre este comic (que recomendo que leiam em inglês embora eu o tenho feito e ficado com pena de certas coisas me terem passado ao lado por isso). Mas, como já disse que isto não é critica nenhuma nem nada que se pareça e estou longe de ser uma perita no assunto, por isso, dizer: leiam este livro!!

P.S.:E ainda me falta agradecer à pessoa que fez com eu soubesse que este livro existia...Obrigado!

terça-feira, 12 de agosto de 2008

Cativar ou ser cativada?


"- Não, disse o principezinho, procuro amigos. O que é que quer dizer “cativar”?
- É uma coisa muito esquecida, disse a raposa. Significa “criar laços…”.
-Criar laços?
- Isso mesmo, disse a raposa. Para mim não passas de um rapazinho muito parecido com cem mil rapazinhos. E não preciso de ti. E tu também não precisas de mim. Para ti sou apenas uma raposa semelhante a cem mil raposas. Mas, se me cativares, teremos necessidade um do outro. Para mim serás único no mundo. E eu serei para ti única no mundo…

(…)

- A minha vida é monótona. Caço galinhas e os homens caçam-me. Todas as galinhas são parecidas umas com as outras e todos os homens são parecidos uns com os outros. Por isso aborreço-me um pouco. Mas se me cativares a minha vida ficará como que iluminada pelo sol. Conhecerei um ruído de passos que será diferente de todos os outros. Os outros passos fazem-me meter debaixo da terra. Os teus, chamar-me-ão para fora da toca como uma música. E além disso, olha! Vês, além, os campos de trigo? Não me alimento de pão. O trigo para mim inútil. Os campos de trigo não me dizem nada. E isso é triste! Mas tu tens cabelos cor de ouro. Então será maravilhoso quando me tiveres cativado! O trigo, que é dourado, far-me-á lembrar de ti. E amarei o som do vento no trigo…
A raposa calou-se e olhou muito tempo para o principezinho.
- Por favor… cativa-me! disse ela.

in "O Principezinho" de Antoine de Saint-Exupéry

Cativar ou ser cativada? Tendo a responder logo que prefiro cativar a ser cativada. Não é bom ser a única a amar o som do vento no trigo… Não é bom sentirmos uma pessoa dentro de nós sabendo que já não existimos dentro dela... Não é bom chegar à conclusão que se calhar nunca chegámos a existir dentro dessa pessoa... Não é bom vermos como as boas memórias foram apenas ilusões agora perdidas no tempo…Não é bom passar a detestar o som do vento no trigo..

Mas também é tão triste saber que sou apenas mais uma conhecida na vida de tanta gente…E que a minha vida está cheia de gente apenas "conhecida"…Gente que sabe que eu existo mas apenas isso. Eu também sei que elas existem, e depois? Onde estão os laços que as tornam únicas para mim? E os laços que me tornam única para elas?

Por isso, sinto-me, tantas vezes, como esta raposa, mas antes prefiro dizer “Por favor… cativa-me… mas deixa que te cative da mesma maneira”…


sábado, 9 de agosto de 2008

Memória de um dia em que estava só e rodeada de gente

Red Hot Chili Peppers - Under the Brige

Sometimes I feel like I don't have a partner
Sometimes I feel like my only friend
Is the city I live in, the city of angels
Lonely as I am, together we cry

I drive on her streets 'cause she's my companion
I walk through her hills 'cause she knows who I am
She sees my good deeds and she kisses me windy
I never worry, now that is a lie.

Well, I don't ever want to feel like I did that day
Take me to the place I love, take me all the way
I don't ever want to feel like I did that day
Take me to the place I love, take me all the way, yeah, yeah, yeah

It's hard to believe that there's nobody out there
It's hard to believe that I'm all alone
At least I have her love, the city she loves me
Lonely as I am, together we cry

Well, I don't ever want to feel like I did that day
Take me to the place I love, take me all the way
Well, I don't ever want to feel like I did that day
Take me to the place I love, take me all the way, yeah, yeah, yeah
oh no, no, no, yeah, yeah
love me, I say, yeah yeah

(under the bridge downtown)
(is where I drew some blood)
is where I drew some blood

(under the bridge downtown)
(I could not get enough)
I could not get enough

(under the bridge downtown)
(forgot about my love)
forgot about my love

(under the bridge downtown)
(I gave my live away)
I gave my life away yeah, yeah yeah

(away)
no, no, no, yeah, yeah

(away)
no, no, no say, yeah, yeah

(away)
But I'll stay

terça-feira, 5 de agosto de 2008

Top 5 "As frases mais cruéis de sempre" - nº1



“O teu sucesso e a tua felicidade residem em ti.”
(Hellen Keller)

Esta frase é para mim a frase mais cruel de sempre porque creio que o seu contrário é igualmente verdadeiro: "A tua infelicidade e o teu insucesso residem em ti.” E é das piores sensações do mundo quando nos apercebemos disso… Nada serve culpar os outros. Nada serve dizer que o mundo é injusto. Nada serve dizer que nunca temos sorte nenhuma. No fundo, sabemos que a culpa de termos falhado é apenas e só nossa. Nossa. Tal como a vontade de realizar os nossos sonhos. Sonhos esses que, sejam quais forem, nos hão-de levar à felicidade. Sim, porque toda a gente quer ser feliz. Seja de que maneira for, mesmo que seja através do seu sofrimento ou do sofrimento dos outros… Toda a gente quer ser feliz, é um facto, mas acho que nunca ninguém conseguiu dar uma definição clara. Uns dizem que existem apenas momentos de felicidade que são momentos de uma alegria extrema, outros dizem que a felicidade é uma consequência de uma elevada concentração de dopamina no sangue e de uma maior quantidade de um certo tipo de neurotransmissores. Não interessa. Acho que nunca ninguém conseguirá essa tal definição de felicidade. A felicidade é como o fracasso: varia de pessoa para pessoa. E daí também que os nossos sucessos e os nossos fracassos apenas possam depender de nós próprios. É muito bom saber disso em relação aos nossos sucessos mas em relação aos fracassos… Por que é que eu falhei? Porque me deixei influenciar por quem não devia? Porque que acreditei tão facilmente? Porque não me consegui concentrar o suficiente por estar a pensar em coisas que não deviam ser tão importantes para mim? Porque não sou bom(a) o suficiente? Porque não sou interessante o suficiente? Porque não me esforcei o suficiente? Porque o meu melhor não é suficiente? E, com estas perguntas todas, sentimo-nos pequenos, muito pequenos… Pisados pela nossa incapacidade. Esmagados pelo sucesso dos outros naquilo que fracassámos. E podemos ficar sempre assim. Tudo bem, sou um fracasso e depois? “Levanta-te!”, ordena uma vozinha dentro de nós, “Podes ser um fracasso agora, mas talvez possas fazer algo para o deixar de ser, não é?”. Percebemos que temos duas opções: continuarmos caídos no chão ou levantarmo-nos. E não interessa quão grande é o fracasso, temos sempre estas duas opções. E mais uma vez é uma decisão só nossa… Sempre. Temos sempre a hipótese de nos levantarmos, independentemente das vezes que já caímos, do quão estamos cansados e doridos… SEMPRE. Mas isto é muito bonito de se dizer, claro… Soa tão bem… E a coragem para o fazermos? E o medo de cair outra vez? Afinal, para quê levantarmo-nos se podemos voltar a cair? Pois, é verdade: podemos voltar a cair vezes e vezes sem conta. Podemos voltar a ser pisados. Podemos voltar a ser esmagados. Mas também podemos crescer com isso… Também podemos levantarmo-nos finalmente… Só que para isso temos que arriscar cair. E saber a diferença entre dois tipos de pessoas que estão ambas caídas no chão: uma pessoa sem coragem e uma pessoa tentou levantar-se mas voltou a cair… Mas podemos não cair. Quem nos diz que não conseguiremos triunfar se tentarmos levantar mais uma vez? Quem nos diz que não conseguiremos realizar, dessa vez, os nossos sonhos? Quem nos diz que não podemos ser felizes, seja lá qual for a nossa definição de felicidade? E quem nos diz que essa felicidade não será mais plena com as cicatrizes e os calos das quedas anteriores? Não sei… Mas sei que a felicidade, de facto, só depende de nós próprios. (In)felizmente…

domingo, 27 de julho de 2008

Top 5 "As frases mais cruéis de sempre" - nº2



“Aprendes que não importa o quanto tu te importas simplesmente porque algumas pessoas não se importam.” (Shakespeare)

Sabem o que é mais cruel que o desprezo de alguém? Eu digo-vos: a sua indiferença. Há muito, muito ,muito tempo (há um ano) eu costumava acreditar que todas as pessoas que conhecíamos na vida deixavam uma espécie de marca dentro de nós. E nós também deixávamos uma marca dentro das pessoas que íamos conhecendo. E que por muitos e muitos anos que passámos sem ver as pessoas que marcávamos, elas se lembravam de algo sobre nós. Mesmo que fosse a coisa mais insignificante do mundo. O nosso sorriso, uma camisola nossa que invejavam, as músicas que gostávamos mais de cantar no sing star, a nossa equipa de futebol… Ou até uma discussão por causa de um trabalho de grupo, uma mentira, uma injustiça, um erro que cometemos em relação a essa pessoa ou ela em relação em nós próprios. Acreditava eu que todos tínhamos dentro de nós uma marca, “boa” ou “má”, de todas as pessoas que já tínhamos encontrado na nossa vida, conhecido de alguma maneira. Uma marca das pessoas que nos tocavam independentemente da insignificância do motivo. Se é que há um motivo específico e determinado para as pessoas se tocarem umas às outras…

Mas há pessoas que nunca conseguimos tocar. Há pessoas que nunca conseguimos que nos vejam. Mesmo que estejamos com elas todas os dias. Mesmo que tenhamos uma história em comum. Mesmo que dêmos o melhor de nós próprios. Há pessoas para as quais nunca ficamos nem passamos. Somos apenas uma mera ilusão do tempo, da vida. Uma sombra desaparecida para sempre pelos raios de sol. Só que o pior não é isto. O pior é que o facto de não conseguirmos tocar uma pessoa faz com que ela nos toque como que para sempre e de uma maneira que não queremos. Sim, porque mesmo não querendo, mesmo parecendo um completo absurdo, essa pessoa acaba por ser importante para nós. Nem que seja porque não queríamos nada que assim fosse...É tão injusto… Tão cruel cada segundo que passamos a pensar nessa pessoa (mesmo que seja “Só quero que ele(a) vá arder no inferno!”), enquanto que, precisamente nesse segundo, ela está a pensar noutra coisa completamente diferente e seguramente mais útil. Mas é como Fernando Pessoa dizia “Morrer é apenas não ser visto.”. E não tocar alguém que nos tocou mesmo que pelo pior motivo do mundo é não nascer nessa pessoa e essa pessoa nascer em nós próprios. Mas o que fazer com a marca dessa pessoa? Com a importância que estamos a dar a algo que mais ninguém dá? Mesmo que os outros estejam errados e nós certos… O que fazer com as memórias boas de uma marca má? O mesmo que às memórias más? Apagá-las simplesmente? Deitá-las para o lixo? Matá-las? Fazer aquilo que essa pessoa que nos marcou fez? Sermos bestas como ela? Mas ela afinal não é uma besta feliz? Não torna mais úteis todos os segundos da sua vida ao não dar importância ao que devia dar?

Mas o mais cruel não é ver feliz essa pessoa que não dá importância ao que supostamente deveria ser-lhe importante. O pior é que nós que, pelo contrário, nos importamos, tornamo-nos cegos como ou até mais que aqueles que não se importam. Sim, porque, como Shakespeare diz, “algumas pessoas não se importam”, isto é, há sempre quem se importe para além de nós mesmos… Pode não ser a pessoa que queríamos mas ela IMPORTA-SE nem que seja um bocadinho! Só que ficamos tão presos às marcas más que os que não se importam deixam em nós que não nos deixamos tocar pelas pessoas que tão ao nosso lado, que se importam. E na nossa sede de mostrar aos outros a importância de coisas que eles nem sequer vêem acabamos nós mesmos por cegar ao que mais importa…

quinta-feira, 24 de julho de 2008

Top 5 "As frases mais cruéis de sempre" - nº3


"Ri-te, e o mundo rir-se-á contigo; Chora, e chorarás sozinho.”

Não sei quem foi o autor desta frase. Eu ouvi-a pela primeira vez no filme “Old Boy” do Park Chan-Wook (que recomendo a mentes não muito sensíveis XD) e pareceu-me logo uma das frases mais cruéis que alguma vez tinha ouvido. Mas, na altura, até nem lhe liguei muito. Fez-me lembrar aquelas tias viúvas que, ao chegarem a casa depois de uma tarde às compras com as amigas, se sentem terrivelmente sozinhas e passam o serão sentadas em frente à televisão apenas com uma cadelinha fofa ao colo para desabafarem as amarguras de uma vida aparentemente perfeita. Por isso, só mais tarde é que percebi da melhor ou pior das maneiras (dependendo do ponto vista como em tudo na vida…) o seu real significado. E quanto esta frase é cruel por reflectir na perfeição o egoísmo e a solidão a que estamos condenados nos momentos mais dificieis mesmo que não o queiramos ver.
À primeira vista, esta frase parece apenas pôr em causa a importância dos amigos e da família. E o seu papel ou a falta dele quando tudo o resto se apaga. Quando tudo o resto se desvanece por entre um céu cada vez mais escuro e cheio de nuvens prestes a desabar sobre as nossas cabeças. Quando já nada conseguimos ver por entre o nevoeiro das lágrimas. E não interessam os motivos que levam a que isto aconteça. Podem ser infinitos. Ou até pode não ser nenhum em especial. Mas a verdade é que toda a gente que já se riu, já chorou. E se chora, tal como se ri em todas as fases da vida. Só que se nos rimos não interessa quem se ri connosco, se o mundo inteiro, se apenas os nossos amigos, se apenas os nossos inimigos. Mas o mesmo não acontece quando choramos. Por que aí… aí deixa de haver amigos, inimigos, conhecidos, desconhecidos. Quando choramos tudo se reduz a duas coisas: nós próprios com a nossa dor e os outros, o mundo que nos rodeia e do qual sentimos, nessas alturas, que já não fazemos parte. Ficamos cegos pela nossa dor. Pelo facto de não a conseguirmos evitar. Presos em nós mesmos. E mesmo que os outros não sejam cegos à nossa dor não nos podem simplesmente libertar. Mesmo que gritemos a plenos pulmões numa sala cheia de amigos. Mesmo que abanemos com força as pessoas que nos rodeiam para que nos ajudem a abrandar a dor. Não lhes cabe a eles sentirem a nossa dor... Simplesmente não podem... No fundo, continuaremos sozinhos...
Daí que a frase “Eu compreendo-te”, pronunciada tantas vezes por aqueles que nos tentam enxugar as lágrimas nesses momentos, seja tão hipócrita… É mais uma daquelas que dizemos porque temos que dizer alguma coisa como perguntar o “tudo bem?” a alguém conhecido que encontramos na rua e que mesmo que dissesse “Não, está tudo mal.” não ouviríamos porque já nos tínhamos ido embora. Na verdade, ninguém pode compreender a dor alheia. Aquela que é quase sempre é menor que a nossa. (Sim, porque se “a galinha do vizinho é sempre mais gorda que a minha”, a minha dor é também sempre maior e mais justificada que a do vizinho.) Nem nenhum dos nossos melhores amigos por muitos que tenhamos. Nem o melhor e mais caro psicólogo do mundo… Nem às vezes nós próprios a podemos compreender quanto mais os outros… É por isso que em vez do “eu compreendo” deveríamos antes dizer “eu estou-te a ouvir” ou simplesmente "vá lá, podes chorar à vontade.” Ou ainda mais simples “Eu estou aqui”. Ou até não dizer nada. Ficar ali apenas à espera que o choro passe seja ele sob a forma de lágrimas ou não… à espera do tempo das gargalhadas.
Sim, porque toda a gente está sempre disposta a uma boa gargalhada. É tão fácil rir mesmo que seja do riso dos outros. Nisso não somos egoístas. Apenas na dor… por parte daqueles que a sofrem e que nunca a conseguem partilhar completamente e por parte dos outros, que mesmo querendo, nunca a poderão compreender…
O mundo não pára se nos rimos. O mundo não pára se choramos. Mas só quando se sofre é que nos importamos com isso… Também ninguém, quando se ri, se sente sozinho…

segunda-feira, 21 de julho de 2008

Top 5 "As frases mais cruéis de sempre" - nº4


Sempre pensei que as amizades continuassem para sempre.Hoje não tenho mais tanta certeza disso. Em breve cada um vai para seu lado, seja pelo destino ou por algum desentendimento, segue a sua vida.
(…)
Quando o nosso grupo estiver incompleto...reunir-nos-emos para um último adeus de um amigo.E, entre lágrimas abraçar-nos-emos.Então faremos promessas de nos encontrar mais vezes daquele dia em diante.Por fim, cada um vai para o seu lado para continuar a viver a sua vida, isolada do passado.E perder-nos-emos no tempo....
(…)
Eu poderia suportar, embora não sem dor, que tivessem morrido todos os meus amores, mas enlouqueceria se morressem todos os meus amigos!"
(Fernando Pessoa)

Estes excertos são de uma carta que esse grande Senhor de nome Fernando Pessoa dedicou aos seus amigos. E, agora, com o final de mais um ano lectivo que traz também para alguns o fim do secundário, é comum ver esta carta ou excertos dela em blogs, nicks, comments do hi5 e afins quase sempre acompanhada pelo tradicional “friends 4ever” ou algo desse género. Esta carta é, pois, símbolo de uma batalha que agora teremos de enfrentar mas que já sabemos, bem lá no fundo, que está, em parte, perdida. Ou na melhor da hipóteses está perdida na maior parte dos casos. É como se lentamente assistisse-mos ao virar da página. Por mais que gostemos da página do livro que agora chegou ao fim temos consciência que para sabermos (ou fazermos) o resto da história temos que virar para a página seguinte. E é sempre preciso saber (fazer) o resto da história. Os livros não foram feitos para ficarem sempre abertos na mesma página…
E certos amigos pertencem apenas a uma página desse livro. Numa página, os amigos são aqueles com quem nos sentamos na carteira da escola ou pedimos lápis emprestados ou trocamos os cromos repetidos ou jogamos á bola no recreio ou desabafamos o nosso primeiro desgosto de amor. Noutra página, os amigos são aqueles com quem jogamos sing star enquanto comemos pizza e estudamos na casa de alguém ou com quem pomos as cusquices em dia ou a quem pedimos conselhos ou com quem fizemos a viagem de finalista ou com quem costumamos sair à noite. Numa página mais adiante no livro, os amigos são aqueles a quem mandamos uma mensagem no Natal e no ano novo ou a quem ligamos de vez enquanto para desabafar alguns dos nossos problemas, desligando antes que o outro comece a contar os dele por causa da conta do telefone. E, assim, as páginas do livro vão-se amontoando umas em cima das outras. Às vezes podemos decidir voltar atrás do livro em jantares de turma ou de curso ou na altura do último adeus repentino a um amigo e prometer que iremos voltar mais vezes atrás na história ou até voltar a escrever parte da história em conjunto, mas o peso das folhas do livro é tão grande… Iremos acabar por adiar o revirar de um montão de páginas já cobertas de pó. E se é algum dia o chegarmos a tentar, o mais provável será vergarmos sobre o peso das páginas amontoadas. É mais fácil continuar na mesma página. É mais fácil adiar o combinar do almoço para amanhã que será certamente melhor dia para o fazer. E se eu me dou ao trabalho de organizar e depois ninguém está interessado?
Mas o mais cruel é que, por isso, acabamos por nos matar uns aos outros enquanto amigos e enlouquecer por dentro como diz Pessoa. Só que quase nunca damos por isso. Nem nunca nos importamos o suficiente para combinar de vez o tal almoço e enfrentar o medo de sermos os únicos que nos importamos. Mas os nossos amigos provavelmente estarão a pensar exactamente o mesmo…
É tão cruel que sendo os amigos tão importantes para nós como o afirma Pessoa no último excerto da carta com toda a razão, a maior parte acabe por ficar de tal forma presos a uma página do livro…E fechado o livro para sempre, as lembranças dos amigos que não nos puderam acompanhar no virar de tantas páginas e que acabámos por matar dentro de nós mesmos sem querer perderam-se inutilmente, tal como uma boa parte de nós mesmos, no tempo...

sábado, 19 de julho de 2008

Top 5 "As frases mais cruéis de sempre" - nº5


“Cada vez que um amigo meu tem sucesso, uma pequena parte de mim morre”.
(Gore Vidal)

Esta é uma daquelas frases que penso que quase toda a gente já viu. E se estava acompanhado(a) por amigos na altura, a folhear distraidamente um daqueles livros de provérbios e ditados para passar o tempo, talvez se tenha rido e abanado que não com a cabeça para rapidamente passar para a página seguinte. É uma frase que nos deixa naturalmente desconfortáveis pois, no fundo, esquecendo, por um pouco, o moral e politicamente correcto, é o que acontece a, pelo menos, toda a gente uma vez na vida. Por várias razões… e talvez nenhuma em especial.

Uma dessas possíveis razões poderá ser porque uma parte desse sucesso também nos pertence. Ou devia-nos pertencer. Sendo amigos dessa pessoa certamente que a apoiámos na sua luta para alcançar o sucesso. Acreditámos no seu valor quando já nem o nosso próprio amigo acreditava. Elogiámos o seu progresso. Apontámos os seus erros. Sugerimos maneiras de os corrigir. No fundo, estivemos lá. Sempre. Mas isso é algo que não se quantifica. Que não se vê. Como tal, é algo facilmente esquecido. Daí que os verdadeiros amigos quase nunca vêem reconhecido o seu valor. Podemos até ficar contentes pelo sucesso do nosso amigo, mas, uma parte de nós, a parte ligada à amizade incondicional, de facto, morre. Pode restar a amizade claro, mas não a pura, a incondicional amizade como a que as crianças juram inocentemente manter para sempre com as suas melhores amigas no recreio da escola. Ou os colegas de turma no baile de finalistas.

Além disso, um amigo é sempre alguém com quem nos identificamos. Podemos até nem dar, por isso, mas a verdade é que um amigo é sempre alguém que tem algo em comum connosco. Seja a escola, seja o estilo de roupa, seja a equipa de futebol ou outra coisa qualquer. Portanto, se esse nosso amigo conseguiu alcançar o sucesso porque é que nós não conseguimos? E entre os parabéns e o tradicional “Estou muito feliz por ti, pá!” surgem na nossa cabeça esta e outras perguntas como: Onde será que errámos? O que será que ele(a) tem que nós não temos?

Uma última razão que encontro para a verdade desta frase é com base numa analogia. Toda a gente sabe que num conjunto de lâmpadas, se uma brilha mais, mesmo que apenas um pouco mais que as outras ofusca-as completamente. E uma das piores sensações que o Homem pode sentir penso ser o de ver o seu sucesso “ofuscado” pelo sucesso dos outros. Mesmo que esses outros sejam seus amigos.

Nós somos, de facto, bichos estranhos. Cruéis. E primeiro connosco mesmos, por isso, não é de estranhar que também o sejamos com os outros. E esta frase é um bom exemplo disso. É, pois, verdade que uma parte de nós pode morrer quando um amigo nosso tem sucesso e não podemos evitar isso. Resta-nos, então, esquecer essa parte que morre e voltar a felicitar o nosso amigo pelo seu sucesso, esperando, no entanto, secretamente que, um dia, também uma parte dele morra por nossa causa…

quinta-feira, 17 de julho de 2008

Um possível porquê para mais um blog...

Talvez este seja apenas mais um blog no meio de tantos outros. Mais desvarios entre muitos desvarios de uma mente descabida entre muitas mentes descabidas. E talvez nunca venha saber exactamente o porquê de ter criado este blog… Insistência de uns talvez (ou melhor um que aproveito desde já por agradecer o entusiasmo e a pachorra de ter esperado tanto XD), mas acho que sobretudo o desejo de escre(ver). De voar por cima de tudo para só assim poder ver. Ver como as coisas realmente são. Ver tudo o que as coisas são. Ver tudo o que as coisas podem ser e não são. Ver tudo o que as coisas não podem ser e são. Ver tudo o que as coisas parecem ser e não são. Ver tudo o que as coisas não parecem ser mas são. Ver como a maioria das coisas são muito pequenas quando vistas de cima. Quando finalmente compreendidas. Outras pelo contrário aumentam de tamanho. Quando compreendemos a sua real importância. Ver. Às vezes é preciso voar para compreender. E escre(ver) para vi(ver).

É claro que tudo isto pode não passar de simples baboseiras foleiras, ridículas e supostamente metafísicas ou algo do género, mas como já dizia aquele grande Senhor “ Não sou nada. / Nunca serei nada. / Não posso querer ser nada. / Mas à parte disso, tenho em mim todos os sonhos do mundo”. E o meu sonho é vi(ver).