quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Realidades

Esta imagem podia descrever alguns dos meus dias. Dias como o de hoje. Um remoinho de sentimentos que ainda não sei definir, uma multidão de pessoas que me podem dizer tudo e, por isso, ainda nada me dizem. É um remoinho ainda formado de muitos feixes com muitas cores de diferentes realidades. Mas talvez as cores pudessem ser diferentes. Não o azul, não o violeta, não o cinzento, não o preto. Talvez o cor-de-laranja, o encarnado, o branco. Mas são exactamente estas cores com que hoje eu pintei os outros à minha volta tal como aquele círculo de feixes luminosos. Aquele azul metálico lembra-me o lume frenético das conversas do refeitório. Aquelas conversas que começam não se sabe de onde nem porquê, que podem ser sobre coisas banais como o prato preferido de cada um ou os gostos musicais ou sobre a próxima festa não sei aonde. Conversas em que toda a gente quer falar ao mesmo tempo e se dar a conhecer para depois terminarem num repentino silêncio quando não há absolutamente mais nada a dizer mas muito ainda por conhecer...
Aquele amarelo mais vivo lembra-me a alegria contagiante de alguns. Aqueles que têm sempre algo a dizer e que toda a gente parece conhecer. O amarelo mais pálido a energia com que tento conhecer toda a gente, decorar os nomes, começar conversas com a esperança (o amarelo mistura-se também com o verde na imagem…) de encontrar nem sei bem o quê. Um grupo estável de amigos se é que isso ainda faz sentido aqui. Mas mesmo que fizesse… (não, quando talvez o que eu mais procuro nos outros é encontrar-me a mim própria...)
Daí tanta cor indefinida nesta imagem do meu dia, de mim própria. Existem tantos tons de violeta nesta imagem… Tantas realidades de mim própria. O violeta. Aquela cor que uns dizem que é cor-de-rosa escuro, outros lilás, outros roxo e outros coisa nenhuma. Tal como a opinião inconsciente dos Outros sobre mim própria talvez. E a minha também. Porque entre o amarelo, o verde, o violeta e todas as outras cores por definir na imagem existem também borrões pretos. São os momentos das saudades, os borrões coloridos de um passado recente pintado a cinzento. São os momentos em que me apago. Em que não consigo captar nada do que me rodeia. Em que não sinto os Outros nem lhes vejo as cores com a indefinição das minhas próprias cores. Em que deixo simplesmente de sentir e me perco a mim própria por não saber quem sou: Eu. Eu própria. Sem as cores dos Outros e as cores (ou falta delas) com que pintam… Sem saber qual a minha cor. Sem saber qual é a minha realidade...


E eis que todas as cores se voltam a misturar outra vez para formar outra realidade…Mas, desta vez, organizam-se para formar uma realidade concreta e objectiva e a mesma que o professor de Histologia entoa com uma voz que se vai tornando cada vez mais próxima. Uma realidade em que esta imagem já não é a imagem do meu dia ou de mim própria. Uma realidade em que esta imagem é apenas o que está escrito na legenda abaixo:

“Corte de um sistema de Havers ou ósteon. Notar a alternância de círculos claros e escuros resultantes da alternância na direcção das fibras colagénias. As fibras colagénias aparecem claras quando cortadas longitudalmente e escuras em corte transversal. No centro do ósteon, a violeta, o canal de Havers. Pricosirius. Foto de microscopia de luz polarizada.“

Um comentário:

Plasticine disse...

Não sei, mas julgo que cada pessoa tem mesmo essa cor que lhe é mais comum, no entanto há dias em que a sua cor está muito alterada, pode ser de cor oposta. Nessa nova vida talvez ainda niguém tenha bem estabilizade a cor para a poderes proporcionar...gostei, adoro cores *.*