Ritmo monótono. Dedilham-se as cordas da guitarra.
Final de tarde. As janelas do prédio em frente reflectem um sol vermelho em rota descendente. Ele começa arrumar os papéis em cima da mesa. Agrafa-os uns aos outros, nuns quantos mete clips, faz pequenos montinhos que arruma em gavetas, pastas ou dossiers. Atira as aparas de borracha para o lixo. Arruma os lápis e canetas na gaveta. Gestos automáticos, mecânicos, entediantes. Finalmente, volta a sentar-se para desligar o computador mais o seu barulho monótono. Entretanto olha para as molduras ao lado do monitor. A filha e agora ex-mulher. Os pais em frente à sua velha casa na terra dos pomares.
Breve pausa na música. O suspense de uma velha memória...
A terra dos pomares. A terra da sua infância. Recomeça o guitarra. E entra o poderoso violoncelo. Cada nota são flashes de memórias julgadas perdidas há muito. Os pomares de maçãs a perder de vista. O barulho dos pardais nas árvores. Os muros de pedras redondas. O cheiro a terra molhada. Os amigos. Os finais de tarde vindos da escola pela estrada de terra. O jogo.
O violoncelo impõem-se. O ritmo cresce!
Ele quase que consegue sentir o esforço do seu corpo ao subir a árvore. E ouvir os gritos de regozijo cada vez que apanhava uma maçã e acenava com ela aos amigos, lá bem no alto, por entre os ramos da árvore. Depos descia com as maçãs nos bolsos. E o jogo recomeçava. Iam de árvore em árvore num corrida desenfreada enfiando as maçãs nos bolsos, no cinto, na mochila. Consegue quase a ouvir o som dos sapatos a bater na terra, o ladrar dos cães que não tardavam a aparecer. Os gritos enfurecidos dos donos atrás deles de pá ou foice na mão. Era tempo de saltar o muro e passar ao pomar seguinte.
O violoncelo e o violino cessam por fim. Agora, apenas a guitarra se faz ouvir.
E terminavam no fundo da estrada arranhados, ofegantes, sujos, estendendo-se na terra e sorrindo para o céu poente. Logo se endireitavam, ainda de respiração descontrolada, para contarem as maçãs roubadas por cada um e elegerem o justo vencedor. E, por fim, cansados e felizes, só se ouvia o trincar das maçãs suculentas e ainda mais deliciosas.
E voltam o violino e o vioncelo.
Todas notas se misturam no rodopio das velhas memórias e no vácuo do regresso à inevitável realidade.
O computador já se desligou. Os vidros do prédio da frente estão escuros em vez de vermelhos quando ele corre as persianas as persianas.
O violoncelo e o violino despedem-se. Últimas notas da guitarra.
Apaga as luzes. Fecha a porta do escritório atrás de si. A do tempo dos putos a roubar maçãs já se fechou há muito...
Final de tarde. As janelas do prédio em frente reflectem um sol vermelho em rota descendente. Ele começa arrumar os papéis em cima da mesa. Agrafa-os uns aos outros, nuns quantos mete clips, faz pequenos montinhos que arruma em gavetas, pastas ou dossiers. Atira as aparas de borracha para o lixo. Arruma os lápis e canetas na gaveta. Gestos automáticos, mecânicos, entediantes. Finalmente, volta a sentar-se para desligar o computador mais o seu barulho monótono. Entretanto olha para as molduras ao lado do monitor. A filha e agora ex-mulher. Os pais em frente à sua velha casa na terra dos pomares.
Breve pausa na música. O suspense de uma velha memória...
A terra dos pomares. A terra da sua infância. Recomeça o guitarra. E entra o poderoso violoncelo. Cada nota são flashes de memórias julgadas perdidas há muito. Os pomares de maçãs a perder de vista. O barulho dos pardais nas árvores. Os muros de pedras redondas. O cheiro a terra molhada. Os amigos. Os finais de tarde vindos da escola pela estrada de terra. O jogo.
O violoncelo impõem-se. O ritmo cresce!
Ele quase que consegue sentir o esforço do seu corpo ao subir a árvore. E ouvir os gritos de regozijo cada vez que apanhava uma maçã e acenava com ela aos amigos, lá bem no alto, por entre os ramos da árvore. Depos descia com as maçãs nos bolsos. E o jogo recomeçava. Iam de árvore em árvore num corrida desenfreada enfiando as maçãs nos bolsos, no cinto, na mochila. Consegue quase a ouvir o som dos sapatos a bater na terra, o ladrar dos cães que não tardavam a aparecer. Os gritos enfurecidos dos donos atrás deles de pá ou foice na mão. Era tempo de saltar o muro e passar ao pomar seguinte.
O violoncelo e o violino cessam por fim. Agora, apenas a guitarra se faz ouvir.
E terminavam no fundo da estrada arranhados, ofegantes, sujos, estendendo-se na terra e sorrindo para o céu poente. Logo se endireitavam, ainda de respiração descontrolada, para contarem as maçãs roubadas por cada um e elegerem o justo vencedor. E, por fim, cansados e felizes, só se ouvia o trincar das maçãs suculentas e ainda mais deliciosas.
E voltam o violino e o vioncelo.
Todas notas se misturam no rodopio das velhas memórias e no vácuo do regresso à inevitável realidade.
O computador já se desligou. Os vidros do prédio da frente estão escuros em vez de vermelhos quando ele corre as persianas as persianas.
O violoncelo e o violino despedem-se. Últimas notas da guitarra.
Apaga as luzes. Fecha a porta do escritório atrás de si. A do tempo dos putos a roubar maçãs já se fechou há muito...
Um comentário:
O difícil nas músicas de Dead Combo (as instrumentais pelo menos) é a imaginação não nos voar para lado nenhum. A tua levou-te a uma bela história :)
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